Três Garotas 10

Capítulo 10

Rodrigo Goldacker
9 min readJul 12, 2019
“woman facing pine trees” by Micah Hallahan on Unsplash

Capítulo anterior aqui.

P-10.

Não existia nenhuma razão para recusar o convite e ele não tinha nada a perder.

Talvez o que acontecera no dia em que conheceu Pam fosse algum tipo de ocasião especial, um erro que não se repetiria com frequência. A única forma de garantir com certeza se ele de fato gostava ou não da companhia da garota seria encontrando-se com ela mais uma vez.

Apenas um dia parecia ser muito pouco para usar na decisão e, de qualquer forma, independente do que resolvesse, acredita que ela merecia pelo menos satisfações dadas ao vivo. Ele estava decidido a tentar dar o melhor rumo possível para aquilo.

Pamela pedira para que se encontrassem em frente à casa dela em cerca de uma hora. Ele se lembrava vagamente do lugar pela rápida visita que tinham feito na noite em que se conheceram. Mesmo que estivesse indeciso e hesitante a respeito do que fariam em seguida, pelo menos sabia que chegar lá não seria difícil. Para onde ela gostaria de levá-lo depois? Ele tinha certo receio sobre isso, já que Pam não dera nenhum detalhe sobre suas intenções.

Vestiu-se com roupas simples e saiu apressado. Enquanto no ônibus, refletiu sobre o que devia fazer agora e sobre tudo que já tinha feito até ali. Com certa mágoa se perguntou o que teria acontecido se tivesse escolhido sentar perto de alguma das outras garotas naquele dia. Não podia afirmar que estaria vivendo algo muito melhor do que aquilo que vivia agora, mas será que teria tido tantos problemas quanto estava tendo? Ele se sentia bastante perdido a respeito de tudo que estava acontecendo. Pam parecia diferente demais dele para que pudessem ter qualquer coisa. Ela era muito jovem e impulsiva, teatral demais, alegre demais. Antes mesmo de se verem, ele já se sentia cansado pelo que poderia acontecer.

Encontrou-a onde haviam combinado. Pam aguardava sentada na calçada em frente de sua casa. Usava uma camiseta preta simples e shorts jeans. Seus cabelos ruivos caiam-lhe pelos ombros em mechas soltas. Sorriu ao vê-lo chegar, levantou e se aproximou. Abraçou-o e deu-lhe um beijo rápido no canto da boca. Ele, surpreso pela recepção acalorada, perguntou com uma simplicidade afetada:

— Então… Para onde a gente vai agora?

Ela sorriu com a pergunta. Pegou-o pela mão e, enquanto guiava-o de volta para o ponto de ônibus, garantiu:

— Pode ficar calmo, prometo que não é nada como foi da outra vez.

Ele se agradou com a promessa. Se aquele encontro fosse mais tranquilo do que fora o último, então aquilo pudesse mesmo dar certo de algum jeito. Se conseguissem fazer as horas passarem sem maiores problemas, se fossem capazes de aproveitar daquele dia normalmente, talvez desaparecesse o receio dele em sair novamente com ela.

Entraram no ônibus e sentaram-se lado a lado, perto da porta. Ela sorria bastante durante o percurso e parecia bastante animada por sua presença, talvez aliviada por ele aceitar encontrá-la novamente.

Desceram do ônibus pouco mais de meia hora depois de entrar. Ela guiou-lhe por mais alguns quarteirões e chegaram num pequeno centro comercial escondido entre o bairro residencial. Ela entrou, levando-o pelo braço, e seguiu para a praça de alimentação. Sentaram-se juntos e conversaram pelas próximas horas, comendo pouco e bebendo cerveja juntos.

Finalmente, ela se levantou e pediu que a acompanhasse. As horas tinham passado rápido enquanto se conheciam melhor e se divertiam rindo das historinhas que compartilhavam um com o outro. Ambos estavam ligeiramente bêbados, mas ainda andavam e falavam naturalmente. Apenas ele foi traído por um pequeno tropeço que deu ao tentar se levantar.

Seguiram para a rua e para a noite escura que começava. Ela sorria bastante e o beijou duas vezes, sem maiores explicações a respeito. Passaram as primeiras horas da noite andando pela cidade juntos, conversando sem maiores intenções e sem um rumo definido. Às nove da noite, Pam alertou que ficava tarde e o convidou para ir até sua casa. Disse que não poderiam fazer muita coisa lá por sua família estar presente, mas que assim poderiam passar mais tempo juntos.

Ele não tinha certeza se queria dar a noite por encerrada. Poderia aceitar, é claro, porque acreditava que conhecer a família de Pam podia ser interessante, mas ele ainda não estava certo sobre os rumos que tomariam juntos. O que a família dela acharia dele, mais velho do que ela e bêbado, chegando assim em sua casa? E como Pamela o apresentaria, como amigo? Talvez devesse sugerir que fossem para a casa dele ao invés disso, seria uma opção mais livre de surpresas. Ou então poderiam continuar andando, por que não? Talvez ali, bêbados e sozinhos, ele conseguisse sair da casualidade com Pam e tratar de algum assunto mais sério com ela. Conhecia-a superficialmente, mas aquilo já o entediava de certa forma: depois das últimas horas, começava a se afeiçoar mais à garota.

Casa de Pam, casa dele ou continuar andando?

D-10.

As luzes da cidade começaram a ser acesas.

Um reflexo amarelado pintava o asfalto úmido de uma garoa sutil que caía. Ela ainda esperava a resposta dele. Ele, por sua vez, estava pensativo encarando o céu. Decidido no que pretendia conseguir finalmente disse, tentando esboçar o máximo de naturalidade:

— A gente podia ir pra sua casa, talvez… Está chovendo um pouco e parece que a noite vai ser fria.

Diana recebeu a sugestão com um sorriso amarelo e um pouco desgostoso. Ela levantou-se e espreguiçou-se, encarou a sarjeta e anunciou, numa voz ligeiramente irônica.

— Tudo bem, mas minha mãe vai estar lá. Quer ir pra minha casa mesmo assim?

Ele acenou positivamente com a cabeça. Com um pequeno riso que não conseguiu conter, deu o ultimato. Aquilo talvez fosse bom demais para ser verdade e aquela visita podia trazer fim para suas desconfianças.

— Tudo bem, eu acho que adoraria conhecer sua mãe.

Diana aceitou, impotente em tentar contestá-lo. O ônibus chegou pouco depois e embarcaram. Sentaram-se na última fileira e Diana apoiou a cabeça no ombro dele. Conversaram grande parte do trajeto, riram com pequenas coisas e contaram mais de suas pequenas histórias. Apenas agora, meses depois de seu primeiro encontro, finalmente pareciam ter tempo para de fato conhecerem um ao outro. Enquanto isso, o ônibus se afastava cada vez mais, indo em direção aos últimos pontos, no extremo da cidade. As ruas ficavam cada vez mais estreitas e os prédios cada vez mais sujos. Ele não disse nada, contanto. Para onde quer que ela o levasse desta vez, ele tinha decidido arriscar quando retribuíra seu beijo. Não poderia dizer mais nada agora e a seguiria independente do rumo que tomassem.

Chegaram ao ponto final. Ela desceu do ônibus num pulo, rindo da expressão desconfiada dele. Não parecia de fato ter mais nada para esconder e agia naturalmente. Talvez não fosse um erro ter decidido ir ali.

Andaram mais quatro quarteirões. Quando finalmente pararam em frente a um condomínio de prédios antigos, eram nove da noite. Ela apertou o interfone e esperou o porteiro abrir o portão enferrujado. Passaram pelo pátio e pelos dois primeiros prédios. Entraram no terceiro, chamaram o elevador. Ele batia os pés, ansioso. Ela cantarolava uma melodia qualquer e mexia o corpo para frente e para trás com as mãos entrelaçadas nas costas. Diana parecia achar grande graça no nervosismo dele e o que não dizia por fala, seus olhares faziam questão de traduzir.

Entraram no elevador e subiram até o antepenúltimo andar, o décimo sexto. Passaram para o hall e ela bateu numa porta de mogno numerada como 313. Com um sorriso aberto e uma entonação sarcástica, ela anunciou:

— Essa é a última chance de mudar de ideia, sabe.

Ele só conseguiu reagir com um riso nervoso. A porta se abriu e foram recebidos por uma simpática pequena senhorinha rechonchuda, com marcas de expressão rudes e trajando um vestido simples de vermelho e azul. Ela sorriu ao ver o convidado e levou-o até a sala.

Diana pediu para que ele esperasse um instante ali e sumiu no corredor. A senhora rechonchuda quis saber o nome dele e como conhecera sua filha. Ele, por sua vez, prestava mais atenção em analisar o ambiente do que em de fato escutar o que a senhora lhe falava. Procurava por qualquer coisa estranha, qualquer tipo de dica ou pista que comprovassem a história de Diana. Procurou retratos ou fotografias onde pudesse ver o possível “pai”, mas não encontrou nada. A mãe gritou para a filha, que ainda estava no quarto:

— Querida, se seu amigo quiser jantar aqui, vou precisar sair para fazer compras.

Diana apareceu vinda do corredor. Estava sem sapatos agora e sorriu ao vê-lo sentado no sofá, encolhido em uma hesitação aparente. Perguntou para ele, com a voz controlada:

— Quer jantar? Ou então a gente só fica conversando mais um pouco. Eu posso ficar aqui com você ou ir ajudar nas compras, você quer esperar?

Ele pensou nas opções. Se escolhesse por jantar, teria alguns momentos a sós com Diana. Caso contrário, poderia conversar mais com a mãe e tentar tocar de algum jeito no assunto sobre o suposto “pai” de Diana. Podia ainda mandar ambas irem juntas e tentar vasculhar alguma coisa. Seria aquilo desconfiança demais? Será que não estava sendo paranoico demais?

Essa é uma decisão mais importante do que parece.

Ficar sozinho com Diana, ficar completamente sozinho o ficarem os três em casa?

M-10.

Ele não podia simplesmente tolerar aquela situação.

Não conseguia se lembrar de nenhum momento em que dera qualquer tipo de motivo para que Megan tentasse afastá-lo dessa forma. Ela permanecia com o mesmo olhar triste, prestes a abrir a porta e entrar, mas ele a impediu.

Com a voz grave e alta, uma postura decidida e os olhos fixos em seu rosto, ele perguntou novamente:

— Por que você sumiu, Megan? Você não pode querer que eu vá embora sem me responder pelo menos isso. — Ele permaneceu encarando a garota. Megan suspirou por um segundo e seus olhos pareceram umedecer ligeiramente. Ela tentou dar mais uma resposta vaga.

— Não é nada… — Foi interrompida. Ele não desistiria tão facilmente de conseguir uma resposta decente.

— Não pode ser nada! Fala de uma vez que eu vou embora, só me diz o que eu fiz!

Ela desistiu de entrar no prédio. Virou-se para ele, encarou-o profundamente e abriu a boca para falar algo. Pareceu mudar de ideia, entretanto, e então o empurrou para o lado, saindo pela rua andando em passos rápidos e pequenos pulinhos.

Ele a seguiu uma vez mais. Falava com ela em voz alta durante todo o percurso e as pessoas ao redor começaram a olhar. Ela escondeu o rosto nas mãos e saiu deliberadamente a correr. Sumiu numa esquina adiante. Absolutamente frustrado, ele seguiu o fim da rua e procurou Megan girando lentamente a cabeça. Reconheceu sua figura apoiada na frente de uma casa e, com passos lentos, foi até ela e apoiou-se ao lado dela na mureta. Ela chorava com o rosto entre as mãos e murmurava palavras pequenas.

— Desculpa… Não foi sua culpa. — Ele sentiu-se ligeiramente mal pela sua atitude. Pediu desculpas por gritar com ela e prometeu que não a incomodaria mais. Virou-se para ir embora, repleto de uma tristeza silenciosa e arrependida, mas foi interrompido por uma pequena palavra de Megan entre seus soluços:

— Espera!

Ele se virou e a encarou, esperando. Ela tirou o rosto das mãos e controlou o choro. Seu rosto estava corado e seus olhos vermelhos, mas Megan suspirou e tentou tomar firmeza o suficiente pra falar.

— A gente pode sair uma última vez sim… Mas vai ter que ser a última. A gente pode passar o dia juntos e eu te explico tudo, mas você tem que prometer que nunca mais vai vir aqui ou fazer isso…

Ele pensou por alguns instantes. Megan olhava para ele ligeiramente desconfiada.

— Você vai ter que prometer isso para mim. Por favor — ela exigiu, dando os termos do acordo para uma última conversa.

Ele podia aceitar o termo e sair com ela. Descobriria a razão de tantos bloqueios e problemas e, talvez, pudesse convencê-la a encontrá-lo novamente. Podia também tentar fazer qualquer outra coisa, nem que fosse continuar tentando conversar para descobrir ali mesmo o que Megan escondia. Mas será que não se sentia cansado demais daquilo tudo? Megan claramente tentava afastá-lo. Talvez o menos dolorido a fazer fosse desistir realmente e ir embora de uma vez.

Aceitar o acordo de Megan, continuar discutindo ou desistir e ir embora?

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Rodrigo Goldacker
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