26

Rodrigo Goldacker
5 min readFeb 21, 2021

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Hoje fiz vinte e seis anos.

Sempre gosto de escrever algo nesse dia, como um marco de onde estive durante a idade que passou. Tem casos em que é algo curtinho, volta e meia é algo maior. Vou começar os 26 escrevendo um pouco mais.

Algumas vezes, o contraste entre onde estava de um aniversário para outro é enorme. Perceber isso me dá uma noção de como minha vida vai caminhando, então gosto de comparar o dia 21 de fevereiro de um ano com o de outro.

Eu comecei os 25 anos numa sexta-feira. Foi logo antes do coronavírus parar o país. Foi a última festa em que estive presente em 2020. Tenho vídeos meus brincando com todo mundo do trabalho, dançando ao redor de um bolo enquanto cantávamos parabéns.

Eu morava em São Paulo ainda, num apartamento na mesma rua em que trabalhava. Fazia mais ou menos um semestre que tinha mudado e parecia bom negócio ficar ali, até que a pandemia me prendeu em casa. O apartamento não tinha varanda e a gente tinha cachorro. Quando dava pra caminhar todo dia na rua, levando a bichinha pra passear duas vezes por dia, era bem tranquilo. Depois complicou. Antes disso, tenho boas memórias dessas caminhadas que dava pelo bairro: do trabalho pra casa, de casa pra pracinha lá perto para dar uma volta. Apesar de alguns problemas, era o lugar em que eu mais tinha gostado de viver em São Paulo na vida toda.

Minha vida não tinha mudado muito dos 22 até a metade dos 24. Comecei os 25 achando que tinha passado por um “momento de transição” muito atribulado, mas que ia começar uma fase mais tranquila dali pra frente. O que aconteceu foi exatamente o contrário. Eu saí de um momento de transição pra outro mais de transição ainda.

Fiquei só um ano morando no apartamento, antes de mudar para uma chácara no interior do estado. É a primeira vez que moro fora da capital paulista. Estou gostando bastante daqui. Todo dia, faz parte da minha rotina cuidar das galinhas, dos patos, do ganso, das cachorras e de um coelho. Estamos arrumando o terreno pouco a pouco para construir uma casa.

O aniversário dos 25 parecia prenunciar um bom ano, mas acabou que 2020 foi terrível pra mim por vários motivos, além daqueles que afetaram também todo mundo. Eu passei por alguns dos piores momentos da minha vida inteira nesse intervalo. Aliás, eu achava que minha vida adulta parecia prenunciar uma boa vida, deixando pra trás muitas coisas terríveis que vivi na infância e juventude, mas acabou que vivi algumas coisas novas tão ruins quanto, ou piores, do que aquelas que tinha deixado pra trás. Até agora me sinto meio zonzo pela exaustão emocional daquilo que passei, principalmente no final do ano passado.

E apesar de cansado, eu sinto que saí dos 25 com algumas mudanças importantes. Uma lembrança boa que fica do ano foi ter sido coorientador de alguns grupos de TCC. Fez com que eu voltasse a dar prioridade pro meu plano de vida acadêmica e por isso estou começando agora um mestrado. Também foi gostoso ver minhas cachorras crescendo. Elas eram filhotes bem pequenas no ano passado, agora já não são mais.

A dor é só terrível. Na minha vida toda, não só em 2020, eu vi muita dor no mundo e vivi minha parcela própria. Não é como se nada disso existisse pra dar lições de moral, mas não quer dizer que não dê pra pelo menos tentar tirar algumas ideias. É o que resta quando algo terrível acontece e sobrevivemos.

Do outro lado, compreendo a raiz daquilo que vivi de bom. Teve muita gente que passou esse ano bem pior que eu. Percebo aquilo que tive de melhor que os outros como o que é, como privilégio.

Não tento mais diminuir, racionalizar ou justificar o que vivi de pior. Como disse, vivi alguns dos piores momentos da minha vida nesse ano que passou. Não teve nada a ver com a pandemia (de certa forma, até poder viver uma tragédia “não relacionada” parece um pouco privilegiado), mas me afetou muito. No fim das contas eu só aceito que passei por isso. Aliás, que estou passando ainda, já que ainda lido com as consequências. Com certeza vou viver outras coisas difíceis no futuro, talvez mais difíceis do que essa. É parte da vida. Só espero ter fôlego pra aguentar. E que viva outras coisas diferentes também.

Por enquanto, já estou vivendo essas outras coisas diferentes. Estou gostando bastante do meu começo de 2021. Além do mestrado, também acabei mudando de emprego, depois de quatro anos onde estava até então. É meio doido lembrar do meu aniversário dos 25 e pensar que era o último que eu ia passar naquele mundo: naquele trabalho, com aquela cabeça que eu tinha, morando em São Paulo, acompanhado daquelas pessoas. Um ano depois aqui estou e minha vida já deu outro rodopio numa direção completamente diferente.

Eu vivi tanta coisa nos últimos anos que não tive muito tempo de entender o tempo que passou. Na minha cabeça, parece que só um sopro de tempo me separa dos vinte e um, vinte e dois, mas já vivi quatro, cinco anos desde então. Eu vivi tanta coisa diferente, mas parece que tudo foi tão rápido que ficou difícil de acompanhar, de conseguir marcar cada fase.

Passei o aniversário dos 26 numa vida nova. A vista na foto é de onde moro agora, aliás. É a primeira foto que guardo dos 26. Gosto muito de olhar pra vista de mato ao redor. É bem gostoso por aqui.

Hoje, como acho que não poderia deixar de ser pelos contextos, fico num estado meio agridoce. Tem muito de melancólico, pelo grito doído do mundo e meu; mas ao mesmo tempo tem algo diferente, algo mais calmo e bonito. Mesmo com as turbulências, sinto que estou deixando o tempo me atravessar com bastante tranquilidade. A vida mais morosa vem, eu gosto dela. Não tenho nenhuma ansiedade por estar começando a jornada pela segunda metade dos 20, aproximando dos 30. Não tenho medo nem receio de envelhecer. Parece, na verdade, que depois de toda a confusão, e apesar de todo o barulho, eu vou cada vez mais chegando a um estado tranquilo dentro de mim.

Apesar de tudo de difícil, consigo cada vez mais olhar para a vida e ver beleza, dentro e fora. E essa serenidade que vou descobrindo, em mim e no mundo, é de longe meu melhor presente.

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